17 de março de 2010

Quotidiano 2

Ela era inteligente, gostava de Sartre e Nelson Rodrigues. Ele era menos interessante, mas tinha o físico ideal para a noite. Como não só as palavras dizem, se convidaram em silêncio para sair.

No primeiro beijo, ela disse a si que não era o homem da sua vida. Quão grande foi a surpresa, então, quando rememorou, anos depois, aquele encontro. Haviam brigado, ele reclamara outra vez das compras exageradas de calçado. Levantou-se resmungando e foi dormir. 

Por uma primeira vez, ela pensou em deixá-lo. Mas quem cuidaria da casa, da comida, da escova de dente? E as filhas? O que diria a família?

Não. Filmes, livros, amigas, todo um mundo de cores e sentido haveria de acalmar seu espírito inquieto. Os dias passavam um a um e um dia deixariam de passar. Mudar agora seria trabalhoso demais, bastava-lhe o trabalho penoso e diário de viver.