30 de setembro de 2009

O peso

Há um dado na estante. Ele está lá, parado, e você tem certeza de que nunca sairá de lá, porque acha que é seu. E é, até você o perder.

Por algum motivo, você pega um pedaço de papel e joga fora, afinal, papeis são todos iguais. Um belo dia, você percebe que não é bem assim, pois aquele pedacinho de sulfite, com seus rabiscos e particularidades, era único.

O que dá sentido às coisas não são as coisas, mas o significado atribuído a elas.

Somos cada dadinho que se foi, cada papelzinho. Se amamos a nós, amamos o significado de cada cheiro, sabor ou tato colecionado com o tempo. A história que nos trouxe até aqui é a história do que somos.

25 de setembro de 2009

Hoje

Hoje acordei encaetaneado. Além de Caetano, passei a manhã ouvindo Belchior. Vim a pé para o trabalho. O céu está azul claro, com poucas nuvens, mas todas de algodão. 

Na noite de ontem ouvi "Tigresa", voz e violão, e hoje tudo ficou mais leve. Dormi e amanheci com ótimas trilhas. No banho, cantei "Alucinação". Hoje, nada ensina mais.

21 de setembro de 2009

Ser quando crescer

Dois e dois são quatro e a qualidade do ensino no país não é das melhores. Óbvio até para uma criança. No entanto, ser ruim não é a pior contribuição do sistema de ensino para a sociedade, embora seja terrível. Há outra, mais difícil de corrigir e mais grave: a insistência com a moral.

Essa, além de justificar erros, também contribui para jogar a culpa pelo desempenho educacional nas costas do aluno. Ela transfere responsabilidades, quando o sistema justifica suas falhas em frases como, por exemplo, "o aluno não aprende porque não quer".

A forma como algumas questões são abordadas no ensino é controversa. Dizem que é na escola que moldamos nossos valores, mas ao mesmo tempo eles são apenas transmitidos. Isso tem uma diferença enorme.

Afinal, uma coisa é estimular uma criança a pensar, passando a ela a importância do processo de reflexão para a construção da sociedade etc. Outra, diferente, é transmitir conceitos moralmente prontos, acabados, de certo e errado.

Reforçam a noção de "sucesso", por exemplo. Fica transmitido o sucesso como projeto de vida, mas o medem pelo que se faz e se tem, o que deixa subjetivamente colocado que, na vida, o mais importante é ter e não ser. Ou que ser na vida é ter.

Entre tantas, essa é uma das maiores atrapalhadas da moral. Pois faz com que a criança aprenda, desde cedo, a responder o que quer "ser" quando crescer. Que pergunta violenta! Fica pressuposto que, enquanto não se tem trabalho, não se é nada. O pai desempregado e o irmão sem profissão, tão comuns, inclusive.

18 de setembro de 2009

O que é de cada um

As pessoas valorizam aquilo que fazem quando não podem ser vistas. Ninguém é o que é quando há mais alguém no quarto, mesmo escuro. As pessoas só são o que são quando estão sozinhas.

15 de setembro de 2009

Bichos

Bichos são bem emocionais. Não conhecem o passado, não se importam com o futuro. Para eles, vale o presente, correr em direção de quem gosta e rosnar para quem não conhece. Não que o bicho-bicho, ao rosnar, queira briga. Apenas quer que o deixe em paz, que não o perturbe, que o deixe com quem se identifica.

Os homens, ao contrário, contam com a ajuda da razão. Não se resumem ao presente. Conhecem o passado, o relembram, e vivem fazendo as mais sérias previsões sobre o futuro. Quando é preciso, o bicho-homem sorri para quem não gosta e finge não gostar de quem gosta. Não é raro querer briga, mesmo sem motivo. Em muitos casos, deixa de lado um amor por questão de conveniência.

Não sei se sou mais bicho-bicho ou mais bicho-homem. Mas sei que existe um ou outro bicho-homem com um pouco de bicho-bicho, embora não exista nenhum bicho-bicho que tenha algo de bicho-homem. Gosto mais do bicho-bicho, é uma espécie mais confiável e tem a lambida bem mais molhada.

10 de setembro de 2009

Sobre a verdade de hoje

Bauman escreveu que nada se torna tradição na vida pós-moderna. As coisas não se repetem, porque são substituídas por algo novo. Como nada tem forma, também não tem fronteira e se liquidifica. As coisas não têm importância, pois, se tudo é passageiro, não há motivos para criar vínculos. Por que ir à fundo se amanhã será diferente?

Essa é a verdade de hoje, embora a história mostre que sempre há perigo na montagem da verdade. E também não sei se a vida precisa de certezas: ando duvidando cada vez mais das verdades que me dizem.

8 de setembro de 2009

Teen Scream

Escrevi uma letra para minha banda, a Nuvem Aquática, chamada "Esquinas". A gente sempre tocou a música em português, mas tenho guardado uma versão em inglês, que ficou bem legal.

Corners

in every corner of this city
there’s forlornness everywhere
sad boys asking for money
real scenes from any day

each street that I walk
sprayed walls, trash on the angles
teenagers loosing their charm
immorality scenes from any night

but, only who knows,
in a filthy alley
where beggars ask for changes
it’s not too late
and it’s not all
but only a little

at each day of this city
attention is took for granted
loosed in the corners
in the running of our cars

pass one and other corner
it’s the hot days and cold nights
ask for money, ask for changes
by the windows of our cars

only who know
about this filthy alley
where beggars ask for changes
realize that is too late
and in this world
we are all subordinate

youth should be the period
that we would pass
discrediting on TV and waiting the future
a rude world wasn’t to have
nobody cares about we think
an if the right is wrong
we got everybody up on the wall

4 de setembro de 2009

Frases que resumem muita coisa

Vários pedacinhos de papel caíram em meu colo. Traziam uma citação, o número de algum telefone ou um desenhinho tonto que fiz em alguma aula, enquanto o professor divagava e eu pensava em música ou qualquer outra coisa. Foi como naquela música do Paralamas: "Eu hoje joguei tanta coisa fora e vi o meu passado passar por mim". Dia de limpar a casa: cartas, rabiscos e projetos (desses que a gente cria para durar uma aula, um dia, no máximo).

Num desses papeis, achei uma frase muito legal: "O tempo no inconsciente nunca passa". Devo ter lido em algum livro. Além dessa, achei outras, soltas. Entre elas, uma ótima de Guimarães Rosa, sutil e leve: "O que lembro, tenho". Outra, um ditado árabe: "O guarda-chuva pode até ser seu, mas a chuva sempre será de todo mundo".

Gosto dessas frases que, em poucas palavras, resumem muita coisa. E daquelas que aparentemente são contraditórias, como "nem todo nonsense faz sentido", de Humberto Gessinger. Outra que gosto é do Paulo Freire: "O mundo não é, mas está sendo". E isto aprendi com a Mada Cosenza, uma amiga: "Quem bem faz, para si faz; quem mal faz, também para si faz".

Outra citação que guardei é do Eric Hoffer: "Nesses tempos de grandes mudanças, aqueles que aprendem herdarão o futuro. Os que acreditam que já sabem vivem em um mundo que já não existe". E esta fala sobre igualdade: "Todo mundo sangra vermelho".

Enfim, poderia colocar outras aqui, já que há dezenas nos fragmentos sobre o colo. Mas vou citar só mais uma, que vi na série Anos Incríveis, que passava na TV Cultura: "Talvez faça parte do amor aprender a deixar partir".